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A Granada

     Para que se ocorra uma catástrofe, basta acionar uma granada dentro de uma casa abandonada com você dentro. E foi o que aconteceu.
      Miguel era um menino muito solitário, não falava muito e geralmente tirava as melhores notas da sua turma, era magro da pele escura, morava no orfanato Iracema Griffin, foi deixado lá pelo pai ainda recém-nascido. Este, na época estava à beira da morte, não porque levou um tiro ou foi espancado, mas porque estava morrendo de fome, literalmente. Depois de sair do hospital público, completamente desolado, pois acabava de perder a esposa no parto de seu único filho, não tinha para onde ir, havia sido despejado naquele mesmo dia. Sem emprego e sabendo que o bebê sairia dali em duas semanas, não teve opção. Durante esse tempo morando na rua, pegou pneumonia e como já não se alimentava, não reagia, já não lhe restava muito tempo. Com a liberação do filho, fez o que achou que era certo, o deixou no orfanato. Dois dias depois, já sem forças, agradeceu aos céus, faleceu.

    Miguel, que já contava com seus quinze anos e que não teve a oportunidade de conhecer os pais e nem a sua história, sempre achou que havia sido abandonado porque era negro ou porque eles não o amavam. Ele sempre sofria, era descriminado, principalmente porque os seus colegas de quarto não lhe davam uma trégua. Diziam que ele era feio, o chamavam de sujo, tratavam-no como se fosse um nada e nem as suas notas da escola o livrava. O mais articuloso de todos era Pedro, de dezesseis anos, de pele clara, olhos claros, um menino fisicamente forte, mas psicologicamente vazio e totalmente sem escrúpulos, que tinha o prazer de humilhar Miguel.
      Até que um dia, Camila, a garota mais bonita da escola, pede que Miguel a ajude a estudar para algumas matérias na qual ela ficou de dependência final. Ele, ficou surpreso, mas muito feliz e aceitou ajudá-la sem nenhuma hesitação. Ela, magra, pele clara, um ano mais velha que ele e muito imprevisível, capaz de tudo para conseguir chamar atenção.
     O tempo foi passando, final de ano chegando, enquanto isso, os dois andavam juntos o tempo inteiro. A fisionomia de Miguel mudou, ele estava feliz e, curiosamente, Pedro durante esse tempo não o importunou mais. Um dia, numa tarde ensolarada, Miguel notou que Camila saíra mais cedo da aula, ficou preocupado e resolveu procurá-la, quando no meio do caminho, escutou umas vozes que vinham de trás de umas árvores e com muito cuidado, foi ver o que era. Tomou um grande susto e ao mesmo tempo teve uma grande decepção. Era Camila, estava quase discutindo com Pedro, falavam baixinho, mas num momento alteraram a voz e foi nessa hora que Miguel escutou a amiga dizendo:
     - Até quando você quer que eu continue enganando o Miguel? Até o fim dos tempos?
    - Olha que não é uma má ideia! Respondeu Pedro com um tom de sarcasmo. Ele parece tão feliz, não é mesmo? - Acrescentou com um sorrisinho no canto da boca.
     - Vá lá. Conte para ele que você não precisava de ajuda coisa nenhuma e que nunca quis ser amiga dele e que foi paga para fingir ser, vai. Vamos ver o que ele vai achar disso. Aposto que vai adorar a notícia. 
     Miguel chorando, completamente transtornado, acaba fazendo barulho, sai correndo sem rumo e encontra uma casa abandonada. Camila o vê correndo e vai atrás dele desesperada. Pedro a segue, não por preocupação, mas para ter o prazer de ver seu inimigo acabado. 
   Eles o encontram, ele está do lado de fora da casa, com uma granada na mão, chorando como nunca havia chorado antes, se sentindo traído, completamente decepcionado e sem nenhuma vontade de viver. E no meio de soluços, começa a dizer algumas coisas:
     - Sempre pensei que não servia para este mundo, que não servia para nada. Nunca vi sentido nenhum na minha vida. Até que eu me apaixonei por uma garota, a mais linda que eu já havia conhecido, gentil, amável, inteligente, que mudou a minha vida, que me deu esperança de um futuro brilhante.  - Dizia ele olhando fixamente para ela.
    Ela e Pedro escutavam assustados, perceberam a granada em sua mão. Pedro pela primeira vez sentiu remorso, e viu que aquilo que ele pensava ser uma brincadeira, poderia terminar em tragédia. Camila, sentia-se culpada, muito culpada, já tinha se arrependido há muito tempo, mas não tinha coragem de dizer a verdade a Miguel, estava apaixonada, tinha medo de perdê-lo, agora mais ainda. Ele vira de costas, mas continua parado, então, ela pede chorando: 
     - Miguel, por favor não faz isso! Eu não vou suportar ficar sem você.... Me desculpa, eu tentei te falar, mas não tive coragem, por favor! - Dizia ela se aproximando aos poucos.
     - Não se aproxime! - Disse ele, com a voz rouca, enxugando as lágrimas. Ela para. É quando rapidamente ele corre para dentro da casa, ela vai atrás e o agarra, eles caem no chão. Pedro, sem saber o que fazer, vai correndo pedir ajuda. Enquanto isso, Miguel puxa o pino da granada, Camila o empurra para fora da casa. A ajuda chega, a granada explode, Camila morre.
    Miguel, não acreditando no que estava vendo, levanta correndo para tentar salvar Camila, mas Pedro chega com o reitor do orfanato, e eles rapidamente o agarram, já sabendo que é tarde demais.
    Miguel é acusado pela morte de Camila, é condenado, mas por ser de menor, paga sua sentença pintando as paredes de escolas durante três anos. Após isto, sai do orfanato e acaba se tornando um desenvolvedor de campanhas contra as formas de repressão, escreve livros contando a sua história e estudos sobre o assunto, faz palestras e consegue grande repercussão, respeito e fama. 
    Com o acidente ocultado pelo reitor, Pedro é finalmente adotado. Mas, tornou-se mais problemático que antes, não era aprovado nas escolas e só causava problemas para sua família adotiva. Ao completar seus dezoito anos, foge de casa, e morando na rua se envolve em uma confusão, e lá acaba sendo morto por dois tiros na cabeça.

Jackeline Miranda

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