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Sedenta Fortuna

Leonardo Victor

      Pouco faltava para o raiar do Sol quando o então milionário Ricardo Alcântara despertou do mais tenebroso sonho que já tivera para falhar miseravelmente em tentar dar fim àquela sede que o atormentava e, consequentemente, ver sua imensa fortuna reduzida consideravelmente. Aquilo já não o assustava mais. E com razão! A loucura que era o mundo do empreendedorismo abalava o mercado internacional a cada instante, não importavam a ações dos economistas. Durante certo horário do dia, o título de Most Rich of The World pertencia aos chineses. Logo depois era vez dos grandes proprietários brasileiros apossarem-se do título. Com sorte, alguns raros engenheiros indianos colocavam o título em suas estantes para despedir-se dele antes do luar. Fato é que já não havia estabilidade econômica desde a descoberta da água como fonte de energia e renda por parte de alguns cientistas, há cerca de duas décadas. Que confusão! Homens do Petróleo viram os zeros de suas gigantescas riquezas serem perdidos um a um enquanto países com grande volume de do líquido investiam maciçamente produção e venda e energia através da água. O número de milionários cresceu vertiginosamente, já que agora o mundo tornava-se uma imensa esfera de ostento. Uns diziam até que o planeta era formado de setenta por cento de ouro transparente -um verdadeiro presente dos cometas-dentre outras extravagancias. Para tanto, o progresso trazia consigo um grande dilema: O que beber agora? Naturalmente continuavam a beber água para sobreviver, mas não a todo momento. Capitalistas, para manterem-se capitalistas, precisavam tomar medidas drásticas e adotar medidas de fracionamento do consumo de água.

        Ricardo era um bom capitalista. Um verdadeiro homem de vasta visão e com a mente programada para aceitar apenas o essencial aos negócios. Fortunas não são construídas com casamento... era um das frases mais ditas por ele. Uma frase meio inconveniente para alguém que já havia sido casado com três moças bem apessoadas. Se Ricardo ama, por que Marcela deveria? Ou Lúcia? Nem mesmo a carinhosa Carmélia soube entender os motivos do capitalista agir assim. Esta última ainda viveu tempo suficiente para receber do marido uma majestosa taça de vinho, do qual estaria cheia de água em breve... mas não breve o suficiente. Ela partiu e Ricardo mais uma vez ficou. Não ficou só, uma vez que um que Carmélia deixou o doce sabor de sua companhia nas amargas papilas gustativas dele. Um sabor doce... como isso o fez feliz por muito tempo. Comer doce era a parte indispensável da refeição pois era o momento em que podia estar com o gosto de Carmélia.

        Muitos meses e pelo menos doze quilos de doces foram minados até que uma forte sede incomodasse o homem atormentado. Já não estava satisfeito com o copo de água que por anos o hidratou. Sempre queria mais e mais, até sentir que não aguentaria mais. Nem a ajuda médica soube dizer com precisão o problema por qual ele passava. Os remédio não resolviam o problema e, como não suficientes, fazia-o ter desagradáveis momentos de insônia. Quando dormia, os pesadelos eram então constantes e com ele, a sede. Não havia nada a fazer que não envolvesse tomar enormes volumes de água por dia. Então, dia após dia, Ricardo consumia litros e litros de sua fortuna. Nove reduzidos a seis zeros que acompanhavam um tímido valor em menos de um mês e aquela terrível sede não sanava. Cada gole era uma confirmação de seu já inevitável destino. Em pouco tempo, sua então gigantesca fortuna estava reduzida a alguns últimos copos cheios que logo foram bebidos. Já não havia o que fazer e agora nem o que beber. Bebia o que não era bebível e o que o ofereciam, até finalmente estar em seu grande delírio solitário. A sede então personificou-se em sua melhor amiga, com quem sempre saia durante o final da tarde para se divertir e depois voltar para sua falida mansão. Realmente não havia o que fazer!

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