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Muito obrigado!

Samily Correa

           O relógio já marca 19h23min. O ônibus que eu pego normalmente não deve demorar muito, dentro de 2 min ele deve estar passando. Dito e feito. Ele não é tão pontual, mas também não se atrasa muito. Ele está vindo. De repente, uma moto para bem em frente ao ponto de ônibus, descendo um senhor já idoso e o piloto segue sua viagem. Eles chegaram com muita pressa. Tenho a impressão de que aquele idoso acabou se atrasando um pouco. Ou então saiu desesperado por conta de uma coisa de última hora. E era.

            O senhor, que não mencionou seu nome, sentou ao meu lado e me contou o ocorrido. Ele não conseguiu pegar o ônibus aonde ele normalmente pega. Eu nunca tinha visto aquele senhor por ali e, de fato, ele não pegava ali. Ele ainda estava um pouco ofegante, por conta de ter corrido para pegar o ônibus. Uma pequena pausa. A idade chega para todos, meus amigos. Continuando. Ele me contou que ele não podia perder aquele ônibus de jeito nenhum, era uma emergência, a sua filha primogênita iria dar à luz dentro de 1h, ele tinha que estar presente, ele não poderia perder esse momento tão importante na vida da sua filha, filha esta que ele tanto amava, apesar de tudo...

            Apesar de tudo. Apesar dela pouco se importar com o estado de saúde do pai, que, após a morte da mãe, continuava morando sozinho, tendo que “fazer das tripas coração” para continuar levando sua vida de forma digna e honesta. Fazer das tripas coração, para quem não está acostumado com essa expressão, significa dar tudo de si, fazer um esforço sobre-humano, e era o que ele também estava fazendo naquele exato momento, para poder assistir ao parto que em breve estará acontecendo. É de conhecimento de todos a situação do transporte público da nossa cidade, nossa bela Manaus. Ainda mais para um idoso da sua idade. Mas ele estava indo e quase ia perdendo o ônibus, o que seria muito triste, pois o próximo demoraria muito a passar. Ele falou que perdeu o ônibus. Ele correu, correu, mas não conseguiu chegar a tempo. Perguntei, num tom de brincadeira: “Como o senhor está aqui, então? ”. Ele respondeu, com um sorriso: “Graças a Deus, meu filho. E graças a um homem que me trouxe até essa parada”. Ele havia perdido o ônibus. Mas ao ver essa situação, um homem desconhecido, totalmente alheio à situação daquele senhor, pegou sua moto e, junto com o idoso, começou a perseguição ao ônibus perdido. Foi quando eles chegaram no ponto de ônibus aonde eu me encontrava. Creio que o sorriso daquele senhor para aquele rapaz dizendo “muito obrigado!” cobriu os gastos, tanto de gasolina quanto do tempo, que o rapaz da moto nem se importou. Ele só se importou em ajudar.

            Às vezes eu fico pensando em tudo de ruim que acontece. Às vezes é difícil acreditar na bondade, no amor das pessoas. Sabe? É tanta violência, tanta maldade, tanta morte, que a gente fica meio receoso quanto às pessoas. Porém - vou até colocar outras conjunções para reforçar -, entretanto, todavia, gestos como este, feito por esse rapaz, o desconhecido da moto, me faz reacreditar na bondade das pessoas, me faz pensar que ainda existem pessoas boas, me faz querer ser uma dessas pessoas.

Eu segui minha viagem, que geralmente é cansativa, de forma bem melhor e desejei tudo de bom para aquele senhor. Eu só espero muito – é o que eu mais quero nesse momento - que a filha daquele senhor, ao ver seu pai ali, junto com ela, assistindo a esse momento tão especial, para ele e para ela, também consiga dizer as mesmas palavras que aquele senhor disse ao rapaz da moto, um “muito obrigado!” sincero, agradecendo ao pai pelo esforço que ele fez para estar ao lado dela nesse momento e ouvindo logo em seguida a maravilhosa história que aconteceu para que ele pudesse estar ali naquele exato momento.

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